quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Apologia ao ócio

A sociedade de consumo capitalista incutiu na mente de todos que o ideal, ou até mesmo o objetivo da vida é enriquecer, e se puder, muito. A falsa idéia de que nesse sistema de divisão social a qual fomos obrigados a fazer parte há uma mobilidade ascendente, ou seja, aquela onde o indivíduo pode mudar de uma classe social inferior para uma superior, faz com que muitos acabem partindo para outros meios de enriquecimento, uma vez que o trabalho enobrece, mas não garante ao trabalhador nada além do que o necessário para sobreviver.
O que resta então para alcançar o topo da pirâmide social de uma maneira fulminante é ganhar na loteria ou então no Big Brother, embora ambos só enriqueçam uns poucos; no caso das loterias um sortudo ou outro, além daqueles que a fraudam; no reality show seus idealizadores e anunciantes, além de um único vencedor, é claro.
Quanto à segunda opção ela é a mais apropriada, pois além de garantir a fama, aumenta, e muito, a conta bancária de uma maneira em que o mínimo esforço é demasiadamente muito. Essa é uma das melhores formas de enriquecer que vemos: passar os dias deitado em colchões espalhados pelo chão ou então dentro de uma piscina ou quem sabe relaxando numa cadeira de jardim, se preocupando exclusivamente com a vida alheia, fuxicos e com outros assuntos fúteis, sendo ainda assistido por milhares de pessoas. Tipinhos inúteis como esses, com corpos moldados da maneira que os padrões de beleza exigem e com uma pobreza espiritual de enormes proporções perpetuam esse modelo sórdido de ascensão social, esnobando daqueles que estão do outro lado da tela.
De todos os dados contabilizados nesse programa alguns ficam esquecidos como o quanto a indústria cultural fatura, o retorno que a emissora recebe com os patrocinadores, como também o próprio resultado que os anunciantes conseguem nas vendas dos produtos divulgados no horário, sem contar as operadoras telefônicas e outras empresas do setor que ganham a cada ligação realizada por um brasileiro.
Em toda cena que se focaliza com precisão os “astros” desse programa, imediatamente penso naquele anônimo que deixa o seu lar antes do alvorecer com a marmita debaixo do braço, que pega várias conduções lotadas até chegar ao seu local de trabalho e lá vai passar por todos os tipos de testes e provas como suportar a sua fatigante função, o seu encarregado que mais parece uma reencarnação de um feitor, um patrão mesquinho, o calor sufocante do dia inteiro trabalhado, e a decepção ao conferir o holerite.
É dessa gente que é feita não só a nossa nação, mas todas as existentes no mundo, e dessa maneira vivem e morrem sem nunca serem lembrados, não importando que o seu esforço é a força que movimenta países inteiros e garante o luxo da minoria que compõe a mais alta camada social. Para essas pessoas um momento mínimo sequer de ócio lhe faria um bem incalculável, mesmo que não viesse acompanhado de um prêmio milionário.
Marcelo Augusto da Silva - 27/02/09