quinta-feira, 24 de março de 2011

Até quando intervir?

A luta dos rebeldes na Líbia contra Kadafi e a dúvida dos países do ocidente e da ONU de intervirem no país contra o governo me fez repensar sobre esse assunto, resgatando um velho dilema e uma grande indagação.
O ocidente, ou então podemos dizer a maioria esmagadora mundial, apóia alguma iniciativa contra a ditadura Kadafi, a qual dispensa maiores explicações sobre o que ela representa para a Líbia e por que não dizer para o mundo. Dessa forma a formação de uma coalizão para lutar contra o tirano é mais do que lógica. Existe nela então uma justificativa que se baseia num pensamento racional que se norteia pela democracia e pela manutenção da não-violência sob todos os aspectos.
Mas se armar e entrar no jogo demente da violência nos torna menos desprezíveis que qualquer ditador, mesmo que essa decisão seja sobre a égide da paz, ou nos iguala à mesma condição execrável? Ou então seria justificável a intervenção e a violência quando utilizada para fins pacíficos? Contradições à parte, fica difícil ser parcial diante de uma questão dessas.
Para aqueles que nasceram, por exemplo, no fundamentalismo e cresceram sob uma educação cega e fanática suas atitudes estão em perfeita normalidade, mesmo que nela se inclua em pegar em armas contra outras pessoas ou matar centenas que estão reunidas. Sob a certeza de que “o que se pensa é o correto” já vimos muitas histórias de violência e chacinas aonde aqueles que a executam têm a plena convicção de estarem fazendo o que é certo, seja pelo próprio bem - o que é mais frequente - seja pelo “bem comum”, tal como ocorreu nas Cruzadas, na Expansão Islâmica, nas ditaduras militares (incluindo a brasileira), no capitalismo, no socialismo, no nazifascismo ou em tantos outros “ismos” que desejam a qualquer preço impor sua doutrina e seu pensamento.
Trocando em miúdos, todas as excrescências, do ponto de vista daqueles que as estavam comandando, tinham razões e motivos plausíveis para terem acontecido. Se nos posicionarmos um pouco de cada lado veremos que cada qual defende a si próprio ou a sua ideologia; para aqueles que estão do lado do bem geral, prevalece o pensamento de que tudo é admissível para manter a ordem, a paz e a justiça para todos. No entanto ao olharmos a situação a partir do ponto de vista do outro o mesmo tem a certeza, dentro de sua concepção, de que o que ele está fazendo é o melhor, embora essa “melhoria” (se é que esse nome é devidamente aplicado nesse caso) represente a vida de muitas pessoas e a supressão de valores e condições mínimas de sobrevivência.
Resta lembrar que nesse fogo cruzado deve imperar o bom senso que diz que quando se realiza uma ação para a preservação da igualdade, da justiça e acima de tudo da vida é que se está fazendo o certo. Dentro dessa visão a conclusão que eu tiro é que numa situação que se faz nessas circunstancias e sob esses valores, assumo posição e fico do lado daqueles que se levantaram e se levantarão contra quem insiste em impor uma opinião contrária a essa, assim como fizeram o Terceiro Estado na Revolução Francesa, a esquerda armada brasileira, as invasões de terras do MST, as mães da Praça de Maio, os bolcheviques, os sandinistas e os rebeldes da Líbia, só para citar alguns exemplos.
Marcelo Augusto da Silva - 25/03/2011

Desespero entre narrativas paralelas

Há determinados tipos de filmes que parecem exercer um certo tipo de atração no expectador; falo isso por mim mesmo me baseando na maneira que seleciono meus títulos. Quando algum filme me chama a atenção, seja pela sinopse, direção ou algum outro fator, comumente ele tem alguma relação com outros que já assisti ou então algo parecido com eles, confirmando assim a minha preferência.
Já faz algum tempo que caí na trilha do gênero denominado por alguns de “filmes-corais”. E por mais que pareça estranho, acabei por selecionar involuntariamente vários filmes (se é que esse estilo guarde tantos trabalhos assim) dessa linha; o que acabou por chamar a atenção e me fez procurar conhecer outras obras do gênero. Trata-se de um tipo de trabalho em que a temática principal é uma situação extrema e agonizante, seja ela amorosa, familiar, social ou pessoal, vivida por vários personagens independentes um dos outros e que muitas vezes se situam num outro tempo, cuja narrativa sobre eles se faz de forma paralela uma da outra, mas que se aproximam por estarem passando pela situação limite comum. Não direcionado ao público que tem como predileção as tramas desenroladas com começo, meio e fim, esse estilo de filmagem é para aqueles que gostam de se sensibilizar, de buscar na arte cinematográfica um olhar sobre determinados contextos ou então algum entendimento sobre a conflitante relação humana.
O primeiro filme desse gênero que tive contato foi Magnólia, (Magnólia, EUA, 1999, Dir. Paul Thomas Anderson) um filme relativamente longo e que me prendeu demais a atenção, principalmente no momento próximo ao final em que acontece a famosa chuva de sapos dando um tom cartático à obra. Depois conheci – e não poderia deixar de mencioná-lo – o magnífico diretor Alejandro Gonzalez Iñarritu, que explorou esse estilo iniciando sua saga com o espetacular Amores Brutos de 1999, seguido por 21 gramas de 2003 e Babel de 2006. Recentemente o diretor lançou Biutiful que parece seguir a mesma grandeza dos filmes anteriores.
Há também Crash – No limite (Crash, EUA, 2004 – Dir. Paul Haggis) que surpreendentemente trouxe a hollywoodiana Sandra Bullock, num filme que, creio eu, veio de certa forma a “popularizar” o gênero e acabou conquistando muitos fãs. Em 2006 foi a vez de Medos Privados em Lugares Públicos (Coeurs, França, 2006 – Alain Resnais) que mais uma vez brilhou na exploração das amarguras e angústias humanas também sob esse modelo de narração.
O cinema nacional também tem a sua contribuição na lista dos “filmes-corais” com o admirável Insolação de 2009 dos diretores Felipe Hirsch e Daniela Thomas, os quais encararam muito bem essa espirituosa tarefa de falar sobre o íntimo das pessoas e de suas vivências numa cidade quente e abandonada, além de O Signo da Cidade de Carlos Alberto Riccelli, lançado em 2007, que lamentavelmente não foi muito próspero nessa realização pois deixou-se cair no vício da pieguice e do final feliz.
E confirmando o que havia afirmado inicialmente, resolvi nessa semana explorar um pouco do cinema oriental e aquele que me despertou interesse foi o sul-coreano Sad Movie, (Saedeu Mubi, Coréia do Su,2005l – Dir. Kwon Jong-kwan) o qual anteriormente nada sabia sobre ele, e verifiquei que o mesmo se enquadra nesse segmento. Decepcionante em determinado momento, pois me transmitiu a sensação de ser demasiadamente apelativo ao ser tão cruel em algumas cenas, mas nada que desmerecesse o trabalho nem a iniciativa da direção, a qual temos que considerar a sua origem num país onde o cinema não é algo que se dedique tanto.
Alguns desses filmes, principalmente as produções dos EUA, são achados facilmente em locadoras, outros já ficam mais restritos. De qualquer forma é uma oportunidade para quem deseja explorar a alma das pessoas, se sensibilizar ou refletir um pouco mais sobre nós mesmo e sobre as relações humanas.
Marcelo Augusto da Silva - 18/03/201