quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Outro tormento para o Haiti

Os desastres naturais parecem estar virando uma constante pelo mundo; enchentes em muitas cidades brasileiras, fortes nevascas no hemisfério norte e o terremoto que atingiu o Haiti no dia 12 de janeiro causando uma tragédia gigantesca.
Indiscutivelmente quaisquer dessas ocorrências é uma desgraça de proporções descomunais, mas pior ainda é para o Haiti onde a rotina do país já é infortúnio em si, agravada ainda mais com esse incidente que deixou a carente população do país com 200 mil mortos e aproximadamente três milhões de desabrigados.
Situado no mar do Caribe o pais ocupa a parte ocidental de uma ilha que privilegia-se por ocupar um local envolto em belezas naturais, no entanto o território não teve sorte ao se localizar bem no limite entre duas placas tectônicas que o tornaram vulnerável aos terremotos de alto graus, como o que ocorreu nesse mês que atingiu 7.3 na escala de Richter, deixando-o praticamente ao chão.
Além dessa falta de sorte na questão geográfia, a história do Haiti não foi diferente para contrabalancear a situação. Inicialmente uma colônia espanhola a parte da ilha – a qual localiza-se o Haiti – foi cedida à França pelos espanhóis que assim como em toda América Central e do Sul sofreu com a exploração européia, que utilizava o território e o seu povo para desenvolver uma atividade agrícola que enriquecesse a metrópole.
No começo do século XIX o Haiti pôde mostrar ao mundo que nem sempre um povo pode ou tem o direito de dominar o outro, principalmente por questões étnicas, já que nesse período o ex-escravo Jacques Dessalines (em 1794 o Haiti após uma revolta escrava tornou-se o primeiro país do mundo a abolir a escravidão) organizou um exército que derrubou e expulsou os franceses, tornando o país livre e liderado por um negro. Era evidente que as nações imperialistas não deixariam esse movimento que solidificar e nem que outros países também pudessem seguir esse exemplo; logo em 1804 escravistas europeus e estadunidenses decretaram um bloqueio comercial ao Haiti que terminou 60 anos mais tarde após o pagamento de 90 milhões de francos ao franceses que haviam cercado o país e exigiam a quantia como forma de indenização.
A partir desse momento o país começa a viver a sua trajetória de instabilidade política e miséria que vai levar à penúria todo povo haitiano. A gravidade é tamanha que só da segunda metade do século XIX ao começo do século XX, dos 20 governantes sucederam-se no poder 16 desses foram depostos ou assassinados. Tropas dos EUA ocuparam o Haiti entre 1915 e 1934, sob o pretexto de proteger os interesses norte-americanos no país. O resultado nem é necessário avaliar.
Caso clássico do autoritarismo e da falta de democracia no país temos com François Duvalier, conhecido como Papa Doc, que apoiado pelos Estados Unidos no contexto da Guerra Fria, instaurou uma feroz ditadura baseada no terror policial dos tontons macoutes (bichos-papões) - sua guarda pessoal - e na exploração do vodu. Presidente vitalício, a partir de 1964, Duvalier exterminou a oposição e perseguiu a Igreja Católica. Papa Doc morreu em 1971 e foi substituído por seu filho, Jean-Claude Duvalier - o Baby Doc que em 1986 decretou estado de sítio. Os protestos populares se intensificaram e ele fugiu com a família para a França, deixando em seu lugar o General Henri Namphy. Posteriormente as crises políticas viraram uma característica do páis onde ocorrem as lutas entre opositores e governo e o desrespeito à Constituição, numa das quais resultou recentemente a intervenção do Conselho de Segurança da ONU que enviou tropas de soldados brasileiros em missão de paz e estabilização política.
Entre tantas desventuras para o Haiti, cujo tamanho é igual aos estados da Paraíba e Sergipe juntos, temos ainda a natureza que castigou os haitianos, que vai penar com a sua pobreza, carência de estrutura física e política e a falta de recursos médicos e financeiros para recuperar o país.


Marcelo Augusto da Silva - 22/11/10

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Nova versão de um problema antigo

Ir ao cinema durante os meses de dezembro e janeiro com a intenção de ver algum lançamento que não seja uma superprodução ou então um filminho inocente é uma investida perdida, pois nessa época só há filmes que se encaixam nesses estilos.
Como não há mais nada interessante resolvi assistir a megaprodução do momento Avatar do diretor James Camerom, que dispensou milhões de dólares em investimentos e tem lotado as salas de todo mundo. Assim fui com a maior despretensão, já preparado para ver algo que não seria nenhuma novidade.
De fato o filme segue o velho esqueminha dos roteiros previsíveis, os quais conseguimos saber o final já nos primeiros minutos de exibição e com recursos computadorizados e efeitos especiais que o deixam mais se assemelhando a um vídeo game de última geração.
O que me chamou a atenção, apesar do enredo tosco, é a versão nova de algo antigo que esse longa metragem trabalha. Explico: a história se passa no futuro, num planeta chamado Pandora, onde os seres humanos o invadem com o objetivo, é claro, de explorar algum recurso que lhe traga bons lucros, que nesse caso é um minério que lá existe em abundância, porém o inconveniente são os nativos desse mundo que não aceitam a invasão humana e lutam como podem para manter o inimigo afastado. Um soldado deficiente é enviado numa missão especial àquele lugar e tem o seu avatar criado – criatura feita em laboratório que se sintoniza com o ser humano numa espécie de simbiose, onde esse humano enquanto dorme numa cápsula passa a ser um elemento nativo, denominado assim de avatar – o qual penetra na paisagem natural de Pandora, uma floresta colorida e habitada pelos mais estranhos seres, cujo aspecto mais se assemelha a uma capa de disco de banda progressiva da década de 1970 e assim passa a conviver com os seres de Pandora.
Do outro lado há um outro militar, seu superior, muito parecido com um misto de Rambo com o boneco Max Stell, que deseja a todo custo conquistar as reservas minerais que são habitadas pelos nativos do planeta. Este faz uma proposta ao militar deficiente para trazer o maior número de informações sobre o local e acabar dessa maneira com os nativos. Nesse meio tempo o avatar do militar começa a envolver com os nativos e a ter o mesmo sentimento de amor à natureza, suas ligações com ela e o seu senso de preservação, o que faz ele a não ficar do lado dos terrestres.
Em meio a isso tudo, apesar da mesmice da trama onde o personagem tirano se redime e fica do lado dos oprimidos, o curioso é que por se tratar de um filme atual e futurista o velho problema que vemos acontecer durante toda a nossa história ainda acontece, como a invasão de territórios já habitados, o não respeito às diferenças, a intolerância e a não aceitação daqueles que são diferentes devido ao interesse de enriquecimento. Dessa vez ele é fora da Terra, provavelmente pelo fato de não mais haver onde explorar e a quem dominar, mas independente do local os acontecimentos são os mesmo; o massacre é o mesmo.
O que fez o roteirista e o diretor desse filme foi mudar de tempo algo que não é novidade, tirou o problema do passado e do presente e o mandou para o futuro e para um local distante. Quanto a mentira de que alguém pode pensar no outro e que os que são molestados podem inverterem o jogo foi mantida, talvez para mascarar essa tendência ambiciosa e preconceituosa, tão presente e característica no povo que realizou o filme.


Marcelo Augusto da Silva - 08/01/09