Sem querer cair na armadilha do chavão “não
existe povo sem memória”, e nem muito menos vangloriar o passado imperial do
Brasil, dedico esse artigo à exumação do corpo de D. Pedro I e suas duas
esposas, as
imperatrizes Dona Leopoldina e Dona Amélia.
É evidente a necessidade de explorar o
passado, principalmente nesse caso, para que se possa dessa maneira apagar
muitos equívocos que envolvem a Família Real; ao mesmo tempo é preciso cuidado
para não enaltecer figuras, que apesar do certo reconhecimento que recebem, não
são tão merecedores de mérito, principalmente se comparados a outros
personagens históricos. Afirmo isso devido ao fato dos vários boatos que giram
em torno de D. Pedro I e suas esposas, e também pelo peso que a realeza ainda
tem nos dias atuais na mente de alguns brasileiros, pois muitos ainda valorizam
esses figurões.
Os corpos da Família Real estão, desde a
década de 1970, numa cripta no subsolo do Monumento à Independência no Parque
da Independência na cidade de São Paulo e, de acordo com o Jornal O estado de São Paulo, poucos
brasileiros sabem da existência dos despojos da Família Real naquele lugar,
inclusive os paulistanos que frequentam o local, indicando pouca preocupação
com nossa história. No entanto, a exumação de corpos, atividade que não é muito
frequente em nosso país, se torna totalmente positiva pelo fato de revisar a
História, despertar o interesse nas pessoas, criar um precedente para outras pesquisas
desse nível e a possibilidade de se iniciar debates.
O
trabalho de pesquisa e exumação - realizado pela historiadora e arqueóloga
Valdirene do Carmo Ambiel, com o apoio da Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo e com a autorização dos descendentes da Família Real - mostrou um
D. Pedro I que foi enterrado sem nenhuma insígnia ou comenda brasileira, tendo
referência ao Brasil que governou somente numa inscrição na tampa do caixão no
qual está gravado “Primeiro Imperador do Brasil”, ao lado da frase “Rei de
Portugal e Algarves”, ou seja, o próprio líder de um Brasil recém-independente
foi enterrado também como líder do país que o colonizou. Desse modo, se confirma
também toda a sua relação intrínseca com Portugal e apaga qualquer levantamento
de hipótese de uma proximidade com o Brasil.
Essa constatação poderia ser rebatida, se o
mesmo tivesse sido enterrado com alguma medalha genuinamente brasileira, o que
poderia indicar assim uma intimidade com o país que ele, ao menos em tese,
contribuiu em formar. A pesquisa revelou ainda que, além das cinco medalhas
portuguesas, o primeiro imperador do Brasil foi enterrado como general
português, vestido com botas de cavalaria, medalha que reproduzia a Constituição
de Portugal e galões com formato da coroa do país ibérico. Viveu como
brasileiro, foi enterrado como um legítimo português.
A proposta que fica dessa exumação é a reafirmação
de um Brasil independente somente na fachada, que teve a sua soberania
conquistada de acordo com os interesses de pessoas e grupos dominantes. Quem
sabe ela possa vir a eliminar de vez a ideia de uma suposta grandeza daqueles
que estiveram envolvidos no conturbado e duvidoso processo de independência que
nosso país teve, já que, como era sabido, trocamos o rei de Portugal pelo seu
filho.
Marcelo Augusto da Silva - 25/02/2013