quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Revolvendo o passado


Sem querer cair na armadilha do chavão “não existe povo sem memória”, e nem muito menos vangloriar o passado imperial do Brasil, dedico esse artigo à exumação do corpo de D. Pedro I e suas duas esposas, as imperatrizes Dona Leopoldina e Dona Amélia.
É evidente a necessidade de explorar o passado, principalmente nesse caso, para que se possa dessa maneira apagar muitos equívocos que envolvem a Família Real; ao mesmo tempo é preciso cuidado para não enaltecer figuras, que apesar do certo reconhecimento que recebem, não são tão merecedores de mérito, principalmente se comparados a outros personagens históricos. Afirmo isso devido ao fato dos vários boatos que giram em torno de D. Pedro I e suas esposas, e também pelo peso que a realeza ainda tem nos dias atuais na mente de alguns brasileiros, pois muitos ainda valorizam esses figurões.
Os corpos da Família Real estão, desde a década de 1970, numa cripta no subsolo do Monumento à Independência no Parque da Independência na cidade de São Paulo e, de acordo com o Jornal O estado de São Paulo, poucos brasileiros sabem da existência dos despojos da Família Real naquele lugar, inclusive os paulistanos que frequentam o local, indicando pouca preocupação com nossa história. No entanto, a exumação de corpos, atividade que não é muito frequente em nosso país, se torna totalmente positiva pelo fato de revisar a História, despertar o interesse nas pessoas, criar um precedente para outras pesquisas desse nível e a possibilidade de se iniciar debates.
   O trabalho de pesquisa e exumação - realizado pela historiadora e arqueóloga Valdirene do Carmo Ambiel, com o apoio da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e com a autorização dos descendentes da Família Real - mostrou um D. Pedro I que foi enterrado sem nenhuma insígnia ou comenda brasileira, tendo referência ao Brasil que governou somente numa inscrição na tampa do caixão no qual está gravado “Primeiro Imperador do Brasil”, ao lado da frase “Rei de Portugal e Algarves”, ou seja, o próprio líder de um Brasil recém-independente foi enterrado também como líder do país que o colonizou. Desse modo, se confirma também toda a sua relação intrínseca com Portugal e apaga qualquer levantamento de hipótese de uma proximidade com o Brasil.
Essa constatação poderia ser rebatida, se o mesmo tivesse sido enterrado com alguma medalha genuinamente brasileira, o que poderia indicar assim uma intimidade com o país que ele, ao menos em tese, contribuiu em formar. A pesquisa revelou ainda que, além das cinco medalhas portuguesas, o primeiro imperador do Brasil foi enterrado como general português, vestido com botas de cavalaria, medalha que reproduzia a Constituição de Portugal e galões com formato da coroa do país ibérico. Viveu como brasileiro, foi enterrado como um legítimo português.
A proposta que fica dessa exumação é a reafirmação de um Brasil independente somente na fachada, que teve a sua soberania conquistada de acordo com os interesses de pessoas e grupos dominantes. Quem sabe ela possa vir a eliminar de vez a ideia de uma suposta grandeza daqueles que estiveram envolvidos no conturbado e duvidoso processo de independência que nosso país teve, já que, como era sabido, trocamos o rei de Portugal pelo seu filho. 
Marcelo Augusto da Silva - 25/02/2013