Não
há como não se posicionar diante dos acontecimentos que envolvem as acusações
ao seu país pela blogueira cubana Yoani Sánchez, seus defensores e à rejeição
dada a ela pelos seus adversários. Inicialmente, deve se saber que em todos os
casos, ou seja, em Cuba, nos manifestantes de ambos os lados e nas palavras de
Yoani há controvérsias que devem ser ditas e discutidas.
Sempre fui um simpatizante do
socialismo e um leitor de Karl Marx, no entanto, consigo entender hoje o marxismo
e a doutrina socialista dentro de seu tempo, e interpreto suas aplicações
dentro da realidade do mundo atual, e provavelmente por isso, não deixo de
enxergar os defeitos de Cuba. É fato que o socialismo da Ilha é uma ditadura em
que não há liberdades, lá é partido único e Fidel Castro - com a explicação de
lutar e defender a revolução - está no governo desde 1959. Por outro lado
também devemos lembrar que não há liberdades em outros países, nos quais os
indivíduos são vítimas de um sistema capitalista que os colocam dentro de uma
prisão invisível em que são condenados a viverem num inferno, no qual existe a
possibilidade de ter, mas não a oportunidade de ter; assim como há também
tiranias dentro de democracias, as quais se aproveitam de brechas na lei ou de
esquemas políticos e conchavos de uma política corrupta para se manterem no
poder.
Se
posicionar do lado do não como faz a nossa mídia gorda (leia-se Veja e Rede
Globo) e julgar a partir de seus próprios valores, é impor uma ideologia sem
que ela passe pelo crivo de uma avaliação imparcial. Difícil e digno é
conseguir ver no outro seus equívocos e ao mesmo tempo admitir seus acertos.
Embora com todos seus erros e com sua ditadura, Cuba tem uma qualidade de vida que
muitas democracias liberais vem tentando conquistar há anos; os cubanos têm
educação e saúde de alto nível, e as diferenças sociais entre eles praticamente
inexistem, o que, creio eu, faz com que qualquer pessoa de outra democracia
deseje viver lá.
O alarde provocado pela visita da blogueira
ao Brasil só vem a acender uma velha disputa entre socialismo e capitalismo, a
qual ela mesma afirmou, é um “discurso fora de moda”, afirmação com a qual
concordo, pois as experiências passadas já anularam essa disputa; além de que suas
aparições serviram também para partidários cegos e fanáticos usarem como
picuinha e ataques histéricos que não vão mudar a situação de nenhum dos lados.
No entanto, Yoani não foi justa, embora
a mesma clame por justiça, ao posar no país como a celebridade do momento, a
qual ocupou as capas de jornais e revistas e dominou o noticiário televisivo,
nem foi justa também ao passear como estrela pelo calçadão de Copacabana tendo
sua hospedagem em hotel cinco estrelas e despesas pagas com dinheiro público da
Secretaria de Turismo do Rio de Janeiro. Cobrou a atuação dos Direitos Humanos
na Ilha sem mencionar as atrocidades que acontecem em Guantánamo[1]
e esqueceu, talvez por querer, de dizer que muitas das carências de Cuba hoje, são
resultados do embargo econômico decretado pelos EUA[2].
Criticar do lado de fora, assim como
fez a blogueira, seus partidários e seus adversários é assumir uma condição
muito confortável.
Marcelo Augusto da Silva - 04/03/2013
[1] Prisão militar
estadunidense dentro do território cubano. Embora essa prisão esteja em Cuba,
os EUA têm total autonomia e soberania sobre ela.
[2] O embargo dos EUA a
Cuba é um embargo econômico, comercial e financeiro imposto a Cuba pelos
estadunidenses a partir 1962, convertido em lei na década de 1990. Em 1999, o
presidente Bill Clinton ampliou este embargo comercial proibindo as filiais
estrangeiras de companhias estadunidenses de comercializar com Cuba, a valores
superiores a 700 milhões de dólares anuais. A medida está em vigor até os dias
atuais, tornando-se um dos mais duradouros embargos econômicos na história
moderna.
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