sábado, 7 de junho de 2008

O senador e o lavrador

“De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto”.
Rui Barbosa
O Brasil é conhecido por todos como o país do contraste, do paradoxo e da discrepância. Poucos ganham muito e muitos ganham pouco; uns comem com colher de prata, outros comem com a mão e uns outros tanto nem comem. Assim como o país é a sua capital, erguida no nada do planalto central, ostenta o luxo sobre uma nação que padece de pagar impostos, de ser humilhada, despojada e abandonada à própria sorte. Local onde pouco se trabalha e muito se ganha, e a sujeira que ali brota é sempre jogada debaixo do tapete.
O jogo de interesses, a falcatrua e o descaramento já fazem parte não só da capital em si, mas também da índole de muitos que de lá nos comandam. A riqueza da cidade mais parece ser um troféu erguido à exploração e à impunidade.
Um fato que exemplifica bem a situação é o recente caso do senador Renan Calheiros que, em meio a uma montanha de acusações pesadíssimas sobre seu governo e a sua conduta política, teve um julgamento às escusas, realizado a portas fechadas à imprensa e a qualquer outro tipo de pessoa que não fosse da casa, sem a mínima consideração com o povo e com os eleitores que confiaram no referido político, investindo-o de direitos para ser seu legítimo representante. No Brasil o sentido de democracia ou de transparência é outro, pois o fato só confirma que alguns são mais iguais que os outros ou então que a lei não é a mesma para todos. Enquanto o país acompanhava perplexo e do lado de fora o “julgamento” lá corria solta a maracutaia e a troca de favores. Ao término sai o dito “réu”, impune, ileso, como se zombasse do brasileiro com seu ar dissimulado, seu sorriso falso e suas palavras ensaiadas.
Para aumentar ainda mais o pesar dos fatos esdrúxulos de Brasília, na quinta-feira, dia 20, um lavrador que há quatro dias não comia, tentou, numa atitude impensada e desesperada, furar a segurança e ir pessoalmente apelar ao presidente. É claro que como sede do governo federal há a necessidade de se manter uma segurança mais rígida possível, mas o episódio é no mínimo revoltante devido ao tratamento que um trabalhador faminto teve em comparação a um político envolvido até o pescoço de denúncias gravíssimas.
A mesma segurança que dias antes usou a força para barrar deputados que queriam usar seus direitos e participarem do julgamento, usaram agora dos mesmos poderes para imobilizar e levar para bem longe um contribuinte que, mesmo com a miséria que recebe, colabora com o sustento da capital do país, seus habitantes e suas sanguessugas. Por que então um tratamento à altura não foi dado a um homem que até o momento não honrou seu cargo, e por que o trabalhador não foi ao menos tratado com o mínimo de dignidade, ao invés de ser humilhado, jogado ao chão e imobilizado como se faz a um contraventor? È necessária tanta rigidez com uma pessoa e tanto cortejo à outra?
No Brasil parece que em nenhuma situação a justiça é feita.

Marcelo Augusto da Silva - 29/09/07

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