segunda-feira, 9 de junho de 2008

Para não mais esquecer do dia 13 de maio

“se você soubesse o valor que o preto tem tu tomava um banho de piche, branco e ficava preto também...
ile ayê - Paulinho Camafeu

No dia 13 de maio desse mês, poucas pessoas sabiam, mas comemorava-se 120 anos da assinatura da Lei Áurea, que deu a condição de liberdade aos escravos.
O fato ocorreu em 1888, um ano antes da Proclamação da República, mas a promulgação da lei não foi um ato tão democrático e tão humano com parece demonstrar ou como o ensino formal transmitiu durante muito tempo.
Anos antes à assinatura da lei já havia no Brasil um atuante movimento abolicionista, que inspirado nos franceses e ingleses, defendia as liberdades individuais e contava com a participação de jornalistas, políticos, poetas escritores e artistas. Junto a esse movimento uma série de leis, que aos poucos vão limitando a escravidão, começam a ser aprovadas, como a Lei Eusébio de Queirós de 1850 que proibia o tráfico negreiro; a Lei do Ventre Livre de 1871, que concedia a liberdade às crianças filhas de escravas nascidas daquela data em diante e a Lei dos Sexagenários de 1885 que declarava livres os negros acima de 60 anos, lei que beneficiou principalmente os donos de escravos pois estes se livravam dos custos de manter um cativo idoso e enfraquecido pela exaustão, favorecidos ainda pela expectativa de vida de um escravo chegava aos 40 anos de idade em média.
Mas porque de um momento para outro o país começa a pensar em leis que, gradativamente, vão contribuindo para a abolição? A grande questão na aprovação dessas leis, bem como a própria Lei Áurea, está na interferência maciça da Inglaterra que havia realizado a sua Revolução Industrial e, pensando unicamente em seus lucros, precisava cada vez mais de consumidores para seus produtos, e como escravo não recebe salário, era urgente transformá-los em assalariados. Além do mais fazia parte da mentalidade européia e de boa parte dos proprietários de terras no Brasil que a mão-de-obra assalariada é muito mais rentável que a escrava, uma vez que não se investe capital na aquisição de um empregado, nem se compromete em alimentá-lo, vesti-lo ou garantir sua saúde e moradia.
Analisando esse aspecto constata-se que a Lei Áurea foi mais um mecanismo de proteção à camada privilegiada do Brasil e também do estrangeiro. No momento de sua promulgação não se pensou numa política de inclusão dos negros recém-libertos, muito menos em dar garantia ao trabalho, à renda e aos direitos de cidadão; isso é bem claro na aprovação da Lei de Terras de 1850, que proibia a aquisição de lotes de terras no país sem qualquer aviso prévio ou mesmo pagamento à Coroa, e como a abolição era iminente, era mais do que necessário limitar o acesso dos negros à principal fonte de renda do país naquele momento, condenando-os assim a viverem nos subúrbios das vilas e cidades brasileiras sem as mínimas condições dignas de existência.
Anos de espoliação, preconceito e humilhação não conseguem ser apagados com um documento, tal como foi a Lei áurea, onde sua assinatura serviu mais como um subterfúgio que inocentava e perdoava o Estado português e o brasileiro pelo massacre cometido aos negros. Mais de um século após a sua assinatura não representou a liberdade do negro, tampouco o seu reconhecimento e o seu valor.
Mais do que lembrar dessa data é preciso mudar o pensamento da humanidade e entender que, antes e acima de tudo, o negro é muito mais que uma força de trabalho que se entregou na construção do país; é muito mais do que uma etnia que formou o povo brasileiro. É na verdade, além disso, tudo um povo digno, possuidor de uma riqueza cultural infinita, dono uma sagacidade inigualável de se manter vivo - no sentido mais amplo da palavra - diante das atrocidades cometidas contra ele e que iniciou o século 21 mostrando ao mundo que diferenças entre pessoas estão somente nas mentes pequenas de quem acredita que elas existem.

Marcelo Augusto da Silva - 23/05/08

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